18 de dez. de 2010

Produção e abastecimento para superar a fome

Murilo Ferreira da Silva*

Em 2008 houve uma explosão nos preços das commodities agrícolas causando enormes preocupações quanto ao problema da segurança alimentar de populações e nações pobres e com debilidades domésticas, estruturais e tecnológicas, na produção agrícola.



 
Mantendo certa distância dessas preocupações a agricultura brasileira teve motivos de sobra para comemorar. O mercado agrícola em alta levou o país a produzir e exportar mais, como no caso do complexo soja que em 2008 exportou U$ 17,98 bilhões, quase 60% superior a 2007, que foi de U$ 11,32 bilhões e poderá exportar U$ 19,64 bilhões em 2011, isto é, quase quatro vezes mais que em 2001, que foi de U$ 5,29 bilhões (Valor: 7/12/10). Já com relação à receita com exportação de carne de frango o Brasil deve fechar o ano com um aumento de 18,5% sobre o ano passado, isto é, de U$ 6,830 bilhões, segundo Francisco Turra, presidente da União Brasileira de Avicultura – Ubabef (Valor: 10/12/10).

Embora haja uma crise econômica se arrastando desde 2007 nos principais centros da economia mundial – EUA, Zona do Euro, Japão – ela pouco sensibiliza a demanda mundial por alimentos. No sentido contrário são os chamados emergentes os responsáveis por significativos aumentos no último período, pois as taxas de crescimento de suas economias impulsionam a renda e o consumo popular.

Dados do Fundo Internacional do Desenvolvimento Agrícola (Fida), da ONU, revelam que melhoras nos últimos 10 anos tiraram 350 milhões de pessoas da pobreza nas áreas rurais, sobretudo na Ásia e em especial na China, e que no Brasil o percentual de população vivendo com U$ 1,25 por dia declinou dramaticamente de 17,7% para 5,2% no período 1988-2008. Alerta, entretanto que persiste o baixo nível de vida entre 70% da população rural de 1,4 bilhões de pessoas nos países em desenvolvimento e que a pobreza ainda é “alarmante” em partes da África.

Parte dos problemas da África é proveniente dos subsídios dos países ricos pagos a agricultores é que solapam a agricultura dos países periféricos. Neste sentido, somente a criação de modernas condições de produção em solo africano pode enfrentar o duplo desafio de atender a demanda interna e produzir com eficiência para enfrentar a concorrência internacional. No último período tem-se observado uma onda de investimentos para a produção agrícola na África, principalmente chineses. Investimentos de empresas brasileiras do setor do agronegócio também estão sendo viabilizados (Valor: 13/12/10).

A China está enfrentando gargalos para o seu abastecimento interno. Ela que exportou pouco mais de cinco milhões de toneladas de milho da safra 2006/2007, terá que importar um milhão de toneladas na safra 2010/2011, segundo estimativas do Departamento de Agricultura dos EUA – USDA (Valor: 7/12/10). Conforme Chen Xiwen, vice-diretor do Gabinete Agrícola da China, o volume de produtos agrícolas importados pela China demanda mais de 40 milhões de hectares em terras agrícolas no exterior que o país não possui (Valor: 10/12/10).

Mas o Brasil também é parte deste processo de aumento de renda dos pobres e elevação da demanda por alimentos. O governo Lula retirou da faixa de pobreza extrema cerca de 26 milhões de pessoas devido à melhoria de renda e consumo dos mais pobres e aos programas sociais. A classe média também foi alargada. Já no Plano de governo da Presidenta eleita Dilma está que ela pretende eliminar a pobreza extrema até 2014. Este é um fato extraordinário para o Brasil, seu povo e sua economia, onde serão incorporados outros vários milhões ao mercado de trabalho e consumo. Foram também fortes estímulos ao mercado interno que fizeram com que o país ficasse livre da crise de 2009 e retomasse um forte crescimento em 2010, que ficará provavelmente em torno de 8%.

Outro aspecto importante além do aumento da renda de populações de países emergentes em forte processo de crescimento é o aumento da população mundial. Segundo Fidel Castro, em uma aula magna a estudantes em Cuba, a população Mundial cresce um bilhão de pessoas a cada 15 anos e questiona a capacidade do capitalismo em suprir as suas necessidades fundamentais. Nesse contexto internacional conturbado e cheio de incertezas o mundo periférico precisa adotar fortes mecanismos que os proteja dos efeitos perversos da crise dos países ricos, persiga um desenvolvimento soberano, sustentado e ancorado em políticas de distribuição de renda, com melhoria na qualidade de vida e eliminação da pobreza extrema. Sendo assim, haverá uma forte valorização dos mercados internos destes países e o crescimento ainda mais robusto de suas economias.

No Brasil a população aumentou de cerca de 169,8 milhões em 2000 para cerca de 190,7 milhões em 2010, segundo o senso 2010 do IBGE, num crescimento de 12,33%. Mas um dado interessante é que em 20 anos, de 1988 a 2008, a população rural declinou 22%, ficando em 27,6 milhões de pessoas, segundo o Fida. Em relação à produtividade do trabalho agrícola o país cresceu 123,7 %, à frente da China (81,6%); Argentina (60,9%); México (32,2%) e Índia (27,3%) (Valor: 7/12/10). Isso mostra a crescente competitividade da agricultura brasileira, muito devido ao grau de mecanização e de utilização de tecnologias que poupam trabalho humano. Para a China há um tremendo desafio que é o de elevar a produtividade do trabalho agrícola num país cuja população rural chega a 754 milhões de pessoas, isto é, mais de 27 vezes a população rural brasileira. Qualquer nova tecnologia ou processo de mecanização leva ao desemprego e ao êxodo de milhões.

Os dados anteriores revelam que a agricultura brasileira tem se tornado cada vez mais eficiente e competitiva, capaz de enfrentar os desafios da atualidade sem sofrer de forma impactante com o elevado protecionismo dos países ricos. Os benefícios de se ter uma agricultura deste tipo são aqueles advindos de uma produção que aumenta numa escala surpreendente, garantindo para a nação o status de segurança alimentar e em quantidade suficiente para atender o mercado interno e externo, a ponto de frear as pressões inflacionárias e gerar gigantescas divisas que são as maiores responsáveis pelo equilíbrio das contas nacionais, principalmente as reservas em dólares no Banco Central - hoje em torno de U$ 285 bilhões.

Outro debate recorrente diz respeito à utilização de áreas para o plantio de soja e milho e que se destinam à produção de biocombustíveis e o quanto isso coloca em risco a segurança alimentar do planeta. Como resposta a esta questão afirmo que desde a explosão dos preços destas commodities houve uma reação imediata da agricultura brasileira e também argentina, para citar outro exemplo, para suprir a suposta escassez de oferta. Os resultados a que vimos foram os contínuos aumentos na produção e exportação destes produtos por ambos os países.

Outro exemplo: o Brasil cobra na OMC o fim dos subsídios aos produtores de algodão nos EUA. Se isso ocorrer irá nos beneficiar e também beneficiará aos produtores Africanos, pois os preços irão se elevar e tornar o negócio mais atrativo e rentável, tendo como conseqüência uma elevação da produção nestas duas regiões produtoras. Em sentido parecido a explosão dos preços das commodities agrícolas a partir de 2008 impulsionou a produção de soja e milho no Brasil.

Tem-se falado, contudo, em escassez de terra cultivável, o que limitaria a oferta. Mas escassez para quem? Para o Brasil? Para a África? Definitivamente não. Além do mais, como foi citado acima, o aumento da produção brasileira tem se dado muito pelos ganhos de produtividade e não por acréscimos de áreas cultiváveis. Será que é isso que incomoda tanto o setor agrícola dos países ricos? Pode-se imaginar o horror que sentiria um agricultor estadunidense ao ver prosperar um modelo agrícola na África equivalente ao brasileiro, de altíssima produtividade e competitividade internacional.

*Murilo Ferreira da Silva – Diretor do Sindicato dos Professores / SINPRO MINAS e da CTB

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